SONIA RANGEL
Sonia Lúcia Rangel. A
12 de outubro de 1948 nasce no Rio de Janeiro. De 1964 a 1968 estuda
na Escola Nacional de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, como aluna do extinto curso de Arte Decorativa, tendo como
professores Fernando Pamplona, Mário Barata, Quirino Campofiorito e
Onofre Penteado, entre outros. Em 1966 como estudante, visita pela
primeira vez Salvador, na época da II Bienal da Bahia. Em 1970 passa a
residir em Salvador e em 1971 transfere-se da UFRJ para a Universidade
Federal da Bahia. A sua produção como artista profissional (em artes
visuais e em artes cênicas) inicia-se no ano de 1973, com dois eventos:
a primeira exposição individual, realizada no Instituto Cultural
Brasil Alemanha, em Salvador, com desenhos e gravuras, onde transpõe
imagens dos seus poemas para o claro-escuro do bico de pena e da água
forte e explora a temática dos transportes urbanos; e, nas Artes
Cênicas, como atriz, cenógrafa e figurinista do espetáculo Abraão e
Isaque , direção de Carlos Petrovich, com temporada na Capela do Solar
do Unhão, em Salvador. Gradua-se pela Escola de Belas Artes da UFBA em
1974 em Licenciatura em Desenho e Plástica.
É
professora da Escola de Belas Artes e da Escola de Teatro da UFBA
desde 1980. Mestre em Artes Visuais em 1995, também pela UFBA.
Interagindo com a poesia, as artes cênicas e as artes plásticas, a
investigação atual se desdobra em projetos artísticos decorrentes da
tese de doutoramento, concluída e aprovada com distinção em 2002, no
Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas, Escola de Dança e Escola de
Teatro da UFBA. A partir do estudo sobre Imagem, Imaginário e
Processos de Criação a artista produz como resultado concepções para
várias formas e formatos, que podem funcionar como obras independentes
ou interagir num mesmo fluxo como Espetáculo-Exposição, trajeto entre
poemas, visualidade e teatralidade.
Além
de vários artigos, publicou dois livros de poemas e imagens, sendo, o
mais recente, CasaTempo, Salvador: Solisluna, 2005, um dos produtos da
sua pesquisa atual. É membro da ABRACE, Associação Brasileira de
Pesquisadores em Artes
Cênicas.
Fonte: Curriculo Lattes
De
Sonia Lucia Rangel
CasaTempo
Salvador: Solisluna, 2005 – 104 p. ilus.
ISBN 87-7744-098-1
Sonia Lucia Rangel
CasaTempo
Salvador: Solisluna, 2005 – 104 p. ilus.
ISBN 87-7744-098-1
Dá
gosto de ver os livros de Sonia! Este eu encontrei numa livraria de
Salvador. Irresistível. Belo, bem projetado, desenhos estimulantes,
poemas instigantes. Para colecionador... A. M.
Corpus
Corpo
Jardim-aquário
Cela-cavalo
Cidade ausência
Peixe-balão
Corpo-tempo
Duplo-morto
Andarilho-corpo
Catedral-oração
Corpo
Jardim-aquário
Cela-cavalo
Cidade ausência
Peixe-balão
Corpo-tempo
Duplo-morto
Andarilho-corpo
Catedral-oração
CorpoCavalo
Porque não nos fizeram os deuses nascer
como os cavalos, fortes e pulando, já em pé?
Por que esta pele tão frágil?
Por que este corpo tão mole que precisa
aprender longamente a maleabilidade de cada
vértebra até se por de pé?
Guarda na pele
Da memória indelével
Essa primeira roupa
Tecida de vitórias e fracassos
De ser um animal
À beira do naufrágio
No mar dos seus temores
É quando sonha como no sonho
Ser um grande cavalo e nada mais
Porque não nos fizeram os deuses nascer
como os cavalos, fortes e pulando, já em pé?
Por que esta pele tão frágil?
Por que este corpo tão mole que precisa
aprender longamente a maleabilidade de cada
vértebra até se por de pé?
Guarda na pele
Da memória indelével
Essa primeira roupa
Tecida de vitórias e fracassos
De ser um animal
À beira do naufrágio
No mar dos seus temores
É quando sonha como no sonho
Ser um grande cavalo e nada mais
De
Circumnavigare
Poemas
Salvador: Fundação Cultural do Estado da Bahia/
Bigraf, 1995
A Igreja
Eu era criança
A igreja era pontuda
E penetrou em mim
Como uma faca penetra numa carne
E não sai
Algumas vezes dói
Algumas vezes sangra
Eu não consigo chorar
Mas a assombração de Deus
Sentada na porta
Chora
A Rua
Um dia tudo ficou velho
De uma vez
Outro dia
A carroça de lixo levou tudo
Levando de uma vez
Mai outro dia
E levaram também a carroça de lixo
O cavalo ainda ficou
Por algum tempo pastando
Pastava que dava gosto
Mas já sem pernas
Até que outro dia
A rua ficou vazia
Mas tão completamente vazia
Que acabaram levando a rua
O Morcego e a Dor
Este morcego é antigo
E seus ruídos
A dor é velha
E sempre dá vontade de parar
Esse morcego ainda é morcego
Porque não há outro nome
Porque só morcego
Pode sobreviver
Nessa longa paisagem mergulhada
Escura
Com uma igreja pontuda bem no meio
Morcego
E ratos roendo Deus
Dentro da igreja
Textura da Morte
Não
A morte não é só
] Esse morcego e esse rato
Que insistem dentro do quarto
Tão estranha a morte
Ela é uma flor
E toda essa memória amarga
Que foi de um criança
E ela é cada gole e cada passo e cada beijo
O Amor
O cosmos da falta e da fartura
O fulcro do desejo e do concreto
A plenitude do eterno e do gratuito
O amor é dentro
Dentro-dentro
Um dentro maldito e sem fim
Que morde com seu dente fundo
E abre
Uma ferida-flor
Cuja alma invisível
É o seu concreto
Mas o outro
Estará sempre lá
Fora do alcance
No encontro possível
Ah o amor
Umbigo embriagado
Lambido selvagem
Labareda
No coração da vertigem...
— Se o outro adivinhasse como é um ouço —
Se o invólucro, a pele
Por um só sagrado momento se rompesse...
Que costura de ansiedade é essa espera
Na lassidão das horas sem tempo definido!
Assinalando como um bicho, ele vai
Em saliva e suor seu território
Ocupando
Absoluto.
Circumnavegare
Volto
E acendo a luz
Dessa casa
Única e múltipla
Onde transbordo e navego
Lagos, rios e mares
Da minha existência.
Em essência,
Continente e oceano,
Sou saudades de ti, ó casa,
E sou tu mesma.
Saudade dos momentos sem saudade.
Onde nada há
Para te conhecer
Para re cor dar
nem com parar.
E passo.
Mas ou também por isso
Sujeito e verbo
Dessa oração nova
Construída a duras penas.
Se volto porque saí
Onde estive para voltar
Ó familiar e assustadora casa.
Se só tua respiração
É a minha luz?
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