segunda-feira, 21 de maio de 2012

NEGADO HABEAS CORPUS


 Ministro considera afastado obstáculo de comparecimento de Carlos Cachoeira a CPMI

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), não acolheu o pedido de prorrogação de prazo formulado pela defesa, indeferiu o adiamento da sessão da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Operações Vegas e Monte Carlo, designada para amanhã (22), e considerou afastado o obstáculo, até agora existente, quanto ao comparecimento de Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlos Cachoeira, perante o órgão de investigação legislativa. A decisão foi tomada no Habeas Corpus (HC) 113548.
,Decisão do  relator do caso:        




HABEAS CORPUS 113.548 DISTRITO FEDERAL
RELATOR :MIN. CELSO DE MELLO
PACTE.(S) :CARLOS AUGUSTO DE ALMEIDA RAMOS
IMPTE.(S) :MÁRCIO THOMAZ BASTOS E OUTRO(A/S)
COATOR(A/S)(ES) :PRESIDENTE DA COMISSÃO PARLAMENTAR
MISTA DE INQUÉRITO - OPERAÇÕES VEGAS E
MONTE CARLO
DECISÃO : Ao suspender, cautelarmente, o comparecimento do ora
paciente perante a “Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - Operações
Vegas e Monte Carlo”, deixei assentadas as seguintes conclusões, todas
elas apoiadas em inúmeros precedentes resultantes da jurisprudência
constitucional que o Supremo Tribunal Federal firmou em matéria de
extensão dos poderes das Comissões Parlamentares de Inquérito e da
oponibilidade, a tais órgãos de investigação legislativa, de direitos e
garantias fundados na Constituição:
(a) a investigação parlamentar, por mais graves que sejam
os fatos pesquisados pela Comissão de Inquérito (CPI), não pode
desviar-se dos limites traçados pela Constituição nem transgredir
as garantias, que, decorrentes do sistema normativo, foram
atribuídas à generalidade das pessoas, físicas e/ou jurídicas;
(b) a unilateralidade do procedimento de investigação
parlamentar não confere, à CPI, o poder de negar, em relação ao
indiciado, determinados direitos e certas garantias que derivam do
texto constitucional ou de preceitos inscritos em diplomas legais;
(c) o indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias
plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897);
(d) no contexto do sistema constitucional brasileiro, a
unilateralidade da investigação parlamentar - à semelhança do que
ocorre com o próprio inquérito policial - não tem o condão de abolir
direitos, de derrogar garantias, de suprimir liberdades ou de
conferir, à autoridade pública (investida, ou não, de mandato eletivo),
poderes absolutos na produção da prova e na pesquisa dos fatos;
(e) a exigência de respeito aos princípios consagrados em nosso
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HC 113.548 / DF
sistema constitucional não frustra nem impede o exercício pleno, por
qualquer CPI, dos poderes investigatórios de que se acha investida; e
(f) o sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado
regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a
atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso ao inquérito
(parlamentar, policial ou administrativo), mesmo que sujeito a regime
de sigilo (sempre excepcional), desde que se trate de provas já
produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento
investigatório, excluídas, consequentemente, as informações e
providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso
mesmo, não documentadas no próprio inquérito ou processo
judicial.
A eminente autoridade apontada como coatora noticia que já não
mais subsistiria o obstáculo que motivou a presente impetração, eis que
os advogados do ora paciente tiveram franqueado integral acesso à
documentação em poder desta CPMI (...)”, fato processual relevante que se
revelaria apto, em tese, a gerar a prejudicialidade da presente ação
constitucional, por efeito de perda superveniente de seu objeto.
Essa informação, emanada do Senhor Presidente da “Comissão
Parlamentar Mista de Inquérito - Operações Vegas e Monte Carloreveste-se
de inquestionável relevo jurídico-processual.
É que o pretendido acesso aos dados e documentos em poder de
referida CPMI veio a ser por esta assegurado ao paciente e aos Advogados
por ele constituídos, o que me levaria a julgar prejudicado o presente
writ” constitucional, eis que aparentemente removido o obstáculo que
motivou esta impetração.
Ocorre, no entanto, que, em razão da medida cautelar por mim
concedida, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito em referência
permitiu, aos Advogados constituídos pelo ora paciente, “acesso aos dados
armazenados nos computadores da notória ‘sala secreta’ instalada no Senado
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Federal”, com uma restrição, porém: a de que, embora possível a ampla e
integral consulta aos documentos e elementos probatórios, esta se
viabilizaria “nos mesmos moldes do acesso franqueado aos Senadores e
Deputados que integram este colegiado”.
Sustenta-se, bem por isso, que “(...) o precário e limitado acesso aos
elementos informativos deferido pela c. CPMI está a léguas de permitir ao
paciente o ‘exercício, em plenitude, do direito de defesa’ e a seus defensores, ‘as
prerrogativas profissionais que lhe são inerentes’”, pois, “(...) impor aos
patronos do paciente as mesmas restrições ‘do acesso franqueado aos Senadores
e Deputados que integram este colegiado’, conforme determinado pelo ínclito
Presidente da Comissão, significa que eles não poderão ‘portar aparelho de
telefonia celular ou qualquer outro que disponha de câmara fotográfica ou
filmadora e que possibilite a reprodução de imagem ou de mídia’, tudo de modo
a que ‘não possam ser transmitidas ou reproduzidas quaisquer informações’
(grifei).
Daí porque os ora impetrantes insistem na pretensão de que “(...)
deve ser mantida, na íntegra, a liminar deferida (...)”.
Devo observar, no entanto, que, em consulta aos registros
processuais que o E. Tribunal Regional Federal da 1ª Região mantém em
sua página oficial na “Internet”, constatei que o ora paciente, réu nos
autos da Ação Penal nº 0009272-09.2012.4.01.3500, em tramitação
na 11ª Vara Federal da Seção Judiciária de Goiás (Goiânia), atuando, por
intermédio dos mesmos ilustres Advogados ora impetrantes desta ação de
habeas corpus”, já havia oferecido, em meados de abril de 2012, defesa
preliminar em referido procedimento penal, certamente fazendo-o,
autorizado pela dilação permitida pelo art. 396-A do CPP, com apoio nos
elementos probatórios a que teve acesso e cujo conteúdo coincide, em
grande parte, com a pretensão veiculada nesta impetração e nas demais
manifestações formuladas, perante esta Suprema Corte, pelos ora
impetrantes.
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HC 113.548 / DF
Vale dizer: o ora paciente teve assegurada, no âmbito de
mencionado procedimento penal, a possibilidade de consultar os
elementos probatórios já formalmente documentados nos respectivos autos,
o que descaracterizaria, quanto a tais dados e informações, o alegado
desconhecimento dos dados informativos por parte de Carlos Augusto de
Almeida Ramos.
Impende destacar, ainda, consoante informações complementares
prestadas pela “Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - Operações Vegas e
Monte Carlo”, que, “(...) até o presente momento, os dignos advogados não
demonstraram qualquer disposição efetiva de analisar a documentação julgada
tão relevante a um simples depoimento a ser prestado pelo ora paciente”, pois
(...) apenas dois profissionais compareceram ao Senado Federal durante toda a
semana que ora se finda, não permanecendo mais que 2 (duas) horas na sala
onde se encontra guardada a documentação” (grifei).
É de assinalar, por relevante, que se propiciou, aos ora impetrantes,
mesmo neste fim de semana (sábado e domingo), amplo acesso a todos os
elementos e documentos probatórios existentes em poder de mencionado
órgão de investigação parlamentar, não havendo notícia, contudo, de que
tenham eles se utilizado de tal faculdade.
Todas as circunstâncias que venho de referir (constatação, de um
lado, de que o paciente já teve, há mais de 30 dias, em abril/2012, acesso
às provas contra ele produzidas nos autos da Ação Penal nº 0009272-
-09.2012.4.01.3500/11ª Vara Federal de Goiânia e não exercício, de outro,
do direito de consultar, inclusive neste último fim de semana, o acervo
probatório em poder da CPMI) levam-me, nesta fase introdutória do
processo de “habeas corpus”, a desacolher o pleito formulado pelos ora
impetrantes, eis que a prorrogação de prazo por eles pretendida, se
deferida em sede meramente cautelar, implicaria total esgotamento do
objeto da presente demanda, com a consequente prejudicialidade deste
writ” constitucional.
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HC 113.548 / DF
Nem se diga que o comparecimento do ora paciente à CPMI em
questão - agora que já se sabe que teve acesso aos documentos contra ele
produzidos nos autos do procedimento penal em curso perante a 11ª
Vara Federal de Goiânia/GO e que também já lhe foi propiciada ampla
consulta ao acervo informativo em poder de referido órgão de
investigação parlamentar - traduziria ofensa, ainda que potencial, ao seu
status libertatis”, pois, como se sabe, assiste, a qualquer pessoa regularmente
convocada para depor perante Comissão Parlamentar de Inquérito, o
direito de se manter em silêncio, que representa direta consequência
fundada na prerrogativa constitucional contra a autoincriminação
(RTJ 176/805-806, Rel. Min. CELSO DE MELLO), sem que o legítimo
exercício dessa faculdade possa justificar a adoção, contra tal pessoa, de
qualquer medida de restrição à sua esfera jurídica (“Nemo tenetur se
detegere”).
Cumpre registrar, por oportuno, não obstante em “obiter dictum”, que
qualquer pessoa convocada (ou requisitada, como na espécie) por uma
Comissão Parlamentar de Inquérito tem o tríplice dever: (a) de comparecer,
(b) de responder às indagações e (c) de dizer a verdade (RTJ 163/626, 635 -
RTJ 169/511-514, v.g.), garantindo-se-lhe, no entanto, como
precedentemente assinalado, o direito de permanecer em silêncio, como
expressão da prerrogativa constitucional contra a autoincriminação.
Não custa relembrar, e reafirmar, uma vez mais, sempre em “obiter
dictum”, que indiciados e, até mesmo, testemunhas (CPC, art. 406, I, c/c
CPP, art. 3º, e Lei nº 1.579/52) dispõem, em nosso ordenamento jurídico, da
prerrogativa contra a autoincriminação, consoante tem proclamado a
jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal
(RTJ 172/929-930, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - RDA 196/197, Rel.
Min. CELSO DE MELLO - HC 78.814/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO,
v.g.):
Não configura o crime de falso testemunho, quando a pessoa,
depondo como testemunha, ainda que compromissada, deixa de
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HC 113.548 / DF
revelar fatos que possam incriminá-la.
(RTJ 163/626, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - grifei)
Descaracterizada, portanto, possível situação configuradora de
periculum in mora”, não vejo como atender o pedido dos ora
impetrantes, que pretendem a manutenção da medida liminar
anteriormente deferida, para que se dispense o paciente, uma vez mais, da
obrigação de comparecer, perante a CPMI em questão, no próximo
dia 22/05/2012.
Sendo assim, em face das razões expostas, além de não acolher o
pedido de prorrogação de prazo formulado pelos ora impetrantes,
também indefiro o pretendido adiamento da sessão da “Comissão
Parlamentar Mista de Inquérito - Operações Vegas e Monte Carlo”, designada
para o próximo dia 22/05/2012, afastado, em consequência, o obstáculo, até
agora existente, ao comparecimento do ora paciente perante esse órgão de
investigação legislativa.
Comunique-se, com urgência, encaminhando-se cópia da presente
decisão ao Senhor Presidente da “Comissão Parlamentar Mista de Inquérito -
Operações Vegas e Monte Carlo”.
Publique-se.
Brasília, 21 de maio de 2012 (20h00).
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
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