Por votação unânime, a Segunda Turma revogou na última terça-feira (6) a prisão preventiva do romeno K.W. e determinou a expedição de alvará de soltura. A decisão foi tomada em questão de ordem apresentada pelo relator, ministro Carlos Ayres Britto, na Extradição (EXT) 1254. O pedido extradicional foi feito pelo governo da Romênia para que K.W. cumpra, em seu país de origem, a pena de três anos de reclusão que lhe foi imposta pela justiça local pelo crime de fraude financeira. Contudo, para manter-se em liberdade, o romeno terá de depositar seu passaporte no STF; não poderá sair do Estado do Rio de Janeiro sem autorização do relator do processo de extradição; terá de apresentar-se uma vez por semana ao juiz do local de sua residência, e assumir o compromisso de atender a todos os chamamentos judiciais. O descumprimento de tais condições implicará a renovação de sua prisão.
Razoabilidade
Os ministros presentes à sessão acompanharam o voto do relator, segundo o qual a prisão preventiva, decretada em julho deste ano, não se coaduna com os princípios constitucionais da necessidade, razoabilidade e proporcionalidade, nem tampouco com o espírito de respeito aos direitos humanos, assim como de proteção à família, emanados da Constituição Federal.
O relator salientou que o crime de estelionato é punido, no Brasil, com penas que variam de um a cinco anos. Além disso, Ayres Britto considerou que K.W. é primário, casado com uma brasileira e pai de um filho brasileiro de sete anos, sendo que ambos dependem dele para sua sobrevivência.
“Isso nos obriga a avaliar eventuais sequelas para a família, decorrentes da manutenção da prisão preventiva”, ponderou o ministro-relator. Segundo ele, a esposa do romeno não trabalha fora do ambiente doméstico. Por seu turno, ele é engenheiro em uma empresa petrolífera, onde trabalha, e tem residência fixa. “Ele pode aguardar em liberdade a marcha processual”, observou o ministro.
Ao lembrar que o estrangeiro tem iguais direitos dos brasileiros, o ministro afirmou que “não se pode sonegar direitos humanos ao estrangeiro”, lembrando que o artigo 5º da Constituição Federal (CF) estabelece, em seu caput (cabeça), que todos são iguais perante a lei e têm direito à liberdade.
O ministro Ayres Britto ponderou que, embora a jurisprudência do STF preveja a decretação de prisão preventiva como condição indispensável nos processos de extradição, ela precisaria ser revista para que se possa examinar, caso a caso, sua real necessidade, razoabilidade e proporcionalidade.
O ministro Celso de Mello lembrou, neste contexto, que a Constituição brasileira de 1946 (Estado Novo) previa prisão preventiva de apenas 60 dias para fins de extradição, a ser revogada se, nesse prazo, o processo de extradição não fosse ultimado, podendo ser concedido HC, se ultrapassado.
Sob a égide dessa Constituição, conforme lembrou, o STF chegou a editar a Súmula 2, prevendo a concessão de liberdade vigiada ao extraditando que estiver preso por prazo superior a 60 dias.
Precedentes
Ao resolver a questão de ordem, o ministro Ayres Britto reportou-se, entre outros precedentes, ao julgamento do Habeas Corpus (HC) 91657, ocorrido em setembro de 2007, no qual o Plenário da Suprema Corte permitiu ao ex-jogador de futebol colombiano radicado no Brasil Freddy Rincón Valencia responder em liberdade a processo de extradição, formulado pelo governo do Panamá.
Já naquele julgamento, a desnecessidade da prisão preventiva para fins de extradição suscitou discussão. O próprio relator, ministro Gilmar Mendes, apoiado pelos ministros Celso de Mello, Ayres Britto, Joaquim Barbosa e Cezar Peluso, sustentou a necessidade de rediscussão desse instituto pelo Tribunal.
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